O contraditório no pedido de reconsideração
- Dr. Vinícius Bueno (OAB/SC 40.836)
- 16 de dez. de 2017
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A Constituição Federal de 1988 consagra, em seu art. 5º, inc. LV, o princípio do contraditório: “aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes”.
Neste sentido, o Novo Código de Processo Civil (NCPC)- que se volta amplamente à valorização e efetiva observância aos preceitos constitucionais[1] -, ressaltou, em seus art. 9º e 10º, o seguinte:
Art. 9o Não se proferirá decisão contra uma das partes sem que ela seja previamente ouvida.
(...)
Art. 10. O juiz não pode decidir, em grau algum de jurisdição, com base em fundamento a respeito do qual não se tenha dado às partes oportunidade de se manifestar, ainda que se trate de matéria sobre a qual deva decidir de ofício.
O Pós-Doutor em Direito, Renan Faria Krüger Thamay, explica que o contraditório se concentra na expressão audiatur et altera pars (“ouça-se também a outra parte”), o que importa em dar-se ao processo uma estrutura dialética.
Assim, ao postular em juízo o autor da ação, terá o réu o direito de contestá-la. Se uma das partes arrolou testemunhas, tem a outra o direito de contraditá-las, de interrogá‑las e também de arrolar as suas. Arrazoou o autor, igual possibilidade deve ser concedida ao réu.
É certo, porém, que o supracitado art. 9º do CPC traz ressalvas, quais sejam:
Art. 9o Não se proferirá decisão contra uma das partes sem que ela seja previamente ouvida.
Parágrafo único. O disposto no caput não se aplica:
I - à tutela provisória de urgência;
II - às hipóteses de tutela da evidência previstas no art. 311, incisos II e III;
III - a decisão prevista no art. 701.
Ao que parece, trata-se de um rol taxativo de hipóteses em que é inaplicável o disposto no caput do art. 9º. Assim, questiona-se: ao ser proferida decisão interlocutória, e apresentando uma das partes PEDIDO DE RECONSIDERAÇÃO daquela decisão, deve o magistrado intimar a parte contrária para que se manifeste?
Destaque-se que o pedido de reconsideração pode ser definido como “o requerimento apresentado pela parte ao órgão judiciário que proferiu o ato decisório para reformá-lo, retratá-lo ou revogá-lo[2]”
Assim, tratando-se de mecanismo passível de alterar uma decisão (especificamente a interlocutória[3]), é de se ponderar acerca da necessária aplicação, ou não, do art. 9º do NCPC neste caso.
Notório que o art. 9º, em seus incisos, não faria prever o chamado Pedido de Reconsideração naquelas hipóteses, por tratar-se de mero instituto criado pelo hábito forense, já tendo sido, inclusive, questionada sua legalidade[4].
Fato é que este mecanismo (Pedido de Reconsideração) é de larga utilização pelas partes nos processos judiciais em geral.
Assim, volta-se ao questionamento: proferindo o juiz decisão interlocutória, e apresentando uma das partes pedido de reconsideração daquela decisão, deveria o magistrado intimar a parte contrária para se manifestar?
O ilustre professor Nelson Nery Júnior ensina que o magistrado não realiza a intimação da parte contrária acerca do pedido de reconsideração postulado, “decidindo logo após o pedido do requerente[5]”.
E no nosso entender, tal atitude do juízo não caracteriza, por si só, violação ao princípio do contraditório. Isto por que a matéria reapreciada deve, teoricamente, ter sido debatida em momento pretérito, sendo desnecessária, portanto, a intimação da parte adversa sobre os limites do pedido de reconsideração formulado, pois, a priori, travar-se-ia o mesmo embate feito anteriormente.
Conclui o professor Nery que, “havendo prejuízo ou desvantagem, esse segundo ato do juiz que acolheu o pedido de reconsideração se classificaria como decisão interlocutória e, portanto, suscetível de impugnação pela via do agravo.[6]”.
Neste aspecto, é de se compreender, portanto, que a decisão interlocutória “atacada” por meio do pedido de reconsideração, quando venha a ser modificada por força daquele pedido, será considerada nova decisão interlocutória.
Assim, poderá a parte contrária impugnar a decisão reconsiderada por meio do recurso cabível (agravo), sem prejuízo de, igualmente, pedir nova reconsideração. Neste caso, pode parecer que o pedido de reconsideração possa vir a ser usado de forma desenfreada pelas partes, a cada mudança na decisão proferida, perdurando a discussão ad eternum.
Entretanto, o magistrado poderá, a qualquer tempo, condenar em litigância de má-fé aquele que acabar por resistir injustificadamente ao andamento do processo, ou fazê-lo com intuito meramente protelatório (art. 80, inc. IV e VII, NCPC).
Concluindo: entendemos que o magistrado, ao deixar de conceder à parte contrária o direito de se manifestar acerca de pedido de reconsideração formulado por seu adverso, não incorre na inobservância do princípio do contraditório; isto por que, como dito, a decisão eventualmente modificada é, novamente, interlocutória, sendo cabível, portanto, recurso de agravo, assegurando-se plenamente o contraditório.
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[1]NCPCC, Art.1oo O processo civil será ordenado, disciplinado e interpretado conforme os valores e as normas fundamentais estabelecidos naConstituição da Republica Federativa do Brasill, observando-se as disposições deste Código.
[2] ASSIS, Araken de. Manual dos Recursos.São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2007, p. 863.
[3] “Pode-se concluir que os únicos atos passíveis de pedido de reconsideração são as decisões interlocutórias (art. 162, § 2º[73]do CPC) e os despachos”. (DONNINI, Rogério. Pedido de Reconsideração. In: Revista de Processo, n. 80, outubro-dezembro. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 1995, p. 242).
[4] VASCONCELOS, Antônio Vital Damos de. O Pedido de Reconsideração e a Preclusividade das Decisões Judiciais. In: Revista da AJURIS. Porto Alegre, n. 40, ano XIV, julho, 1987, p. 155.
[5] NERY JÚNIOR, Nelson. Teoria Geral dos Recursos. 6. Ed. Atual. Ampl. E reform. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2004, p. 97.
[6] NERY JÚNIOR, Nelson. Teoria Geral dos Recursos. 6. Ed. Atual. Ampl. E reform. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2004, p. 97-98.
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